quarta-feira, 8 de junho de 2011

Metade - Oswaldo Montenegro

"Que a força do medo que tenho



Não me impeça de ver o que anseio



Que a morte de tudo em que acredito



Não me tape os ouvidos e a boca



Porque metade de mim é o que eu grito



Mas a outra metade é silêncio.



Que a música que ouço ao longe



Seja linda ainda que tristeza



Que a mulher que eu amo seja pra sempre amada



Mesmo que distante



Porque metade de mim é partida



Mas a outra metade é saudade.



Que as palavras que eu falo



Não sejam ouvidas como prece e nem repetidas com fervor



Apenas respeitadas



Como a única coisa que resta a um homem inundado de sentimentos



Porque metade de mim é o que ouço



Mas a outra metade é o que calo.



Que essa minha vontade de ir embora



Se transforme na calma e na paz que eu mereço



Que essa tensão que me corrói por dentro



Seja um dia recompensada



Porque metade de mim é o que eu penso, mas a outra metade é um vulcão.



Que o medo da solidão se afaste, e que o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportável.



Que o espelho reflita em meu rosto um doce sorriso



Que eu me lembro ter dado na infância



Por que metade de mim é a lembrança do que fui



A outra metade eu não sei.



Que não seja preciso mais do que uma simples alegria



Pra me fazer aquietar o espírito



E que o teu silêncio me fale cada vez mais



Porque metade de mim é abrigo



Mas a outra metade é cansaço.



Que a arte nos aponte uma resposta



Mesmo que ela não saiba



E que ninguém a tente complicar



Porque é preciso simplicidade pra fazê-la florescer



Porque metade de mim é platéia



E a outra metade é canção.



E que a minha loucura seja perdoada



Porque metade de mim é amor



E a outra metade também".